sexta-feira, 21 de maio de 2010

O circo de Washington

Hugo Chaves e Lula a estreitarem os laços de cooperação econômica entre seus países firmando novos acordos neste sentido, que venham contribuir decisivamente para a integração, como queria Simon Bolívar, do continente Sul das Américas.
É por governar nesta direção e por empenhar-se em dar continuidade a seu programa de governo, que Lula tem quase 100 por cento de aprovação popular, como demonstram as pesquisas de opinião, dependendo para isso da vitória de sua candidata nas eleições que se aproximam. E é o presidente brasileiro o alvo principal dos interessados em fazer com que o Brasil e nações co-irmãs entrem em processo regressivo.
Washington comanda o espetáculo, que inclui ainda as impagáveis “mulheres de branco” em suas manifestações no centro de Havana por liberdade para os anticastristas postos atrás das grades por ameaçarem a Revolução cubana. Se os norte-americanos se acharem ameaçados em seu próprio, território, como, aliás, se divulgou ainda recentemente o caso de um carro-bomba encontrado em plena Times Square - o que fariam senão efetuar as detenções de inimigos de seu regime e enviá-los a alguma das muitas bases prisionais que Washington possui no mundo. Ou, como já fizeram ao tempo de George Bush: encerrá-los em jaulas na base aérea de Guantánamo, inflingindo-lhes castigos corporais e morais como os de Abu-Ghraib, usando inclusive cães amestrados a fim de aterrorizá-los.
Quanto aos anticastristas presos em Havana por atentarem contra a Revolução, não se ouviu notícia alguma de que hajam sido torturados, nem de que lhes faltasse o alimento. Lembremo-nos do que aconteceu a um anticastrista que se recusara a alimentar-se, entrando em greve de fome até morrer estupidamente... E surgem as “mulheres de branco” em manifestações pelas ruas de Havana num longo documentário de tevê em que aparecem em primeiro plano, lado a lado, Fidel Castro e Lula, numa clara montagem fotográfica. A época é de campanha eleitoral no Brasil e a finalidade desse documentário é queimar Dilma Roussef como a candidata que se propõe dar continuidade à linha econômica e social do atual governo.
E que dizer da condenação de Sadan Hussein à forca por um corpo de juízes de engonço movido por uma troupe de militares ianques dos desvãos da Casa Branca? O olhar fixo e imperturbável de Sadan diante de seu carrasco, e dos próprios juízes de fachada, denunciava um dos crimes mais hediondos da História recente, a ponto de haver traumatizado até pessoas normalmente distanciadas do noticiário internacional.
Vem agora o dançarino Barack Obama - não o viram enlaçar sua Primeira Dama no dia da posse, saracoteando ao som de um blue na sacada do Salão Oval da Casa Branca? – com a petulância de querer impor seu presumido poder de veto à iniciativa brasileira de resolver diplomaticamente o problema do enriquecimento de urânio pelo Irã.
Deve ele, ao parecer, estar esfregando o nariz nos acolchoados de sua, agora, residência oficial, a tentar, inutilmente, passado tanto tempo, aspirar os odores do romance menos proibido que inconveniente, pouco ou nada indecoroso, do ponto de vista das liberalizações, caso se desenrolasse num motel ou que fosse num iate, entre Bill Clinton e a estagiária Mônica Lewinsky.
Assim é o Circo de Washington, mescla de descaminhos orais e “atos cirúrgicos” de guerra como aqueles fulminantes no feitio de mísseis eletronicamente dirigidos, através de uma parafernália de máquinas, desfechados sobre Bagdá, a Bela, diria o escritor Mansour Challita, pela “maior democracia do mundo”, cometendo esta o pecado, mais que mortal, da destruição de grande parte da História da Humanidade.
Que direito assiste a Washington no contexto da sócio-economia mundial para conter o Oriente Médio na busca de melhores condições de vida para seus povos, da mesma forma que o Brasil e outros países ditos emergentes, o que somente poderá ser conseguido armando-se adequadamente a exemplo do que fizeram os Estados Unidos da América e a antiga União Soviética, que foi desmantelada em razão de infiltrações de agentes da CIA mas que hoje, na roupagem de Rússia, por olhar Washington com certa desconfiança, mantém pelo menos grande parte dos seus mísseis apontada para a “maior democracia do mundo”.
Caberia, então, ao Brasil corrigir a sua Carta constitucional no dispositivo inspirado em uma ditadura que durou três décadas, iniciada, em tese, em 1964, o qual deixou nosso país impossibilitado de fabricar a sua bomba nuclear.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Capitão América é candidato

Capitão América é candidato

O candidato do PSDB à sucessão do presidente Lula, José Serra, que nos primórdios de sua militância política, por distração da estudantada da época, chegou a ser guindado à presidência da UNE, União Nacional dos Estudantes, agora descarrega farpas, indiscriminadamente, contra todas as iniciativas progressistas e de estabilidade econômica do país no atual governo, tais como o retorno da Telebrás, o aumento da renda per capita nacional, a redução substancial das diferenças sociais entre ricos e pobres, segundo as mais recentes estatísticas, e inclusive seu empenho, juntamente com países vizinhos, no fortalecimento e expansão do Mercosul.
Com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a soprar-lhe ao ouvido, quem sabe, pois tudo aponta nesta direção, o que deve ele, Serra, falar ou fazer. Assim, este aspirante ao poder maior da República não poupa petardos de oratória contra um governo mundialmente reconhecido em sua luta para acabar com a fome no Brasil e reduzi-la em regiões do planeta em que parece ter-se enraizado.
A ex-ministra de Minas e Energia e da Casa Civil do governo Lula e sua candidata preferida ao pleito de outubro próximo, Dilma Rousseff, já declarou que, se eleita, vai restabelecer a política da iniciativa estatal como base primacial dos empreendimentos públicos no país. Disse que vai governar prioritariamente para os mais necessitados e para que o Brasil alcance em breve espaço de tempo e de facto o patamar de grande potência. E que aqueles que pregam o “Estado mínimo” escamoteiam os prejuízos que o Brasil somou em sua economia com as criminosas privatizações feitas a partir da “doação”, como diria o jornalista Hélio Fernandes na nova fase de sua Tribuna da Imprensa, da Companhia Siderúrgica Nacional, a CSN, um dos esteios da arrancada do país para sua emancipação econômica, fincado pelo presidente Getúlio Vargas, do mesmo modo como o foi a Companhia Vale do Rio Doce, privatizada por Fernando Henrique Cardoso, evaporando-se em pouco tempo todo o dinheiro apurado com este e outros negócios de uma China de anedotário. É ler, ou reler, o que a Folha de S. Paulo publicou há anos a respeito das privatizações feitas àquela época. Em extensa e muito bem fundamentada reportagem, a Folha mostrou, provando com números oficiais, os prejuízos causados à Nação brasileira por tais negócios, que FHC já havia anunciado da tribuna do Congresso Nacional nas entrelinhas ou no bojo do discurso por ele pronunciado, de despedida das lides parlamentares, a fim de assumir a presidência da República. Quando apregoou o fim da era Vargas. Quis dizer que daria um fim ao “Estado mínimo”, entregando o país à iniciativa privada. E lá se foi, de roldão, além da CSN e da Vale do Rio Doce – o riquíssimo vale dos minérios que vinha sendo explorado pelos ingleses sob uma concessão anterior a Vargas, foi devolvido ao Brasil em troca da participação de nosso país na II Guerra Mundial, ‘guerra de cachorro grande’, deve ter pensado aquele presidente - da mesma forma como fora acertada com os americanos a construção da usina de Volta Redonda – muitas outras estatais, além da quebra do monopólio estatal do petróleo, até zerar o Estado, tal como defendiam os privativistas tão ignominiosa solução que por pouco não se concretiza, também, no próprio Banco do Brasil. Içando a bandeira de tio Patinhas sobre o continente Sul das Américas.
Quanto a José Serra, ainda bem ter-se posicionado, em campanha, favorável ao programa bolsa-família, pretendendo mesmo ampliá-lo, como disse, caso ganhe a eleição. Este programa é o carro-chefe de Luiz Inácio Lula da Silva e cujo sucesso teve grande repercussão no mundo inteiro, tendo o presidente brasileiro, por esta sua iniciativa, recebido várias homenagens no exterior, especialmente de organismos internacionais.
O tio Patinhas é o símbolo canhestro de Norteamérica, o qual rumina seus dias velejando pelo mundo, há séculos, a passar a perna nos mais desavisados. Disfarça-se, às vezes, por exemplo, de Principe Submarino ou de Capitão América. Como Capitão América, participa de campanhas eleitorais, na condição mesmo de candidato, em todos os quadrantes do globo, só se dando mal, a rigor, na ilha caribenha dos irmãos Castro e na Venezuela do temido e inflexível Hugo Chaves, o país que nada em petróleo, enchendo os olhos dos americanos do Norte.
Da parte do Brasil, pode-se dizer, tranquilamente, que ele vai muito bem, em contraste com a crise financeira que percorre países da Europa como a Grécia, Espanha e Portugal, tendo o ministro Guido Mantega observado que a economia brasileira se acha agora imune a essas turbulências, com boas reservas internacionais em caixa.

Lei da pele branca

Lá dos States chega-nos a notícia pela Globo News de que no Estado do Arizona o seu governador baixou uma nova lei de imigração pela qual qualquer cidadão que não tiver a pele branca e seu cabelo for preto poderá ser abordado pela autoridade policial mandando apresentar seus documentos. Os casos suspeitos de imigrantes ilegais serão encaminhados à autoridade competente, que lhes dará o destino que a tradição americana indicar. A de triste memória remonta aos tempos separatistas, de brancos de um lado e negros de outro, nos coletivos, nas escolas, nas próprias ruas, quando lhes era vedada, por exemplo, a passagem pela Times Square. Tudo isso, sem falar na Ku-Klus-Klan, a atear fogo em casas de negros, e bem assim nas bárbaras investidas de policiais em praça pública contra aqueles que não tivessem a pele branca.
No rol dos perseguidos, nos dias de hoje, se bem que sem a fúria de um passado não muito distante, estão os chamados hispanos, que se uniram, por esta razão, em comunidades, dentro das quais se fala, de prefrência, o espanhol. Incluem, além de mexicanos, bolivianos e outros cidadãos de fala hispânica, também brasileiros e demais imigrantes morenos ou mulatos.
Conversa de rua
- Quer dizer que se Barack Obama pôr os pés no Arizona terá de desembolsar documentos provando ser o presidente dos States!
- Isto mesmo! E ele que se cuide, porque branco azedo lá é picada de abelha fêmea, só passando a dor fazendo-se uma boa fricção com pinga das Minas Gerais.
- Por falar em Obama, vi na tevê uma entrevista do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Thomas Shannon, em que, perguntado pelo repórter se era verdade que a popularidade do novo presidente estava mesmo caindo, respondeu na bucha com um gesto afirmativo, num balanço rápido e repetitivo de queixo para cima e para baixo.
- Hi...
- E o embaixador fala razoávelmente o português.

Lula e a moeda do impossível



Lula e a moeda do impossível

Pingarroxos da imprensa ocidental, incluindo-se alguns brasileiros, em especial do telejornalismo, à exceção de analistas conscientes de sua responsabilidade ética perante a opinião pública como José Pinguelli Rosa, catedrático da Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidente da FBMC, cujas opiniões sobre o problema nuclear no mundo, sempre que entrevistado se acham afinadas com o respeito à soberania dos povos, primam por mistificar, descaradamente, situações concretas.
O prof. José Pinguelli, em recente entrevista ao canal de tevê Globo News, após ouvir várias entrevistas estapafúrdias sobre o acordo nuclear firmado pelo Brasil em Teerã por iniciativa do presidente Lula, contando inclusive com o aval da Turquia, deixou no ar a indagação por que só o Irã estaria impedido de enriquecer o urânio, tanto mais pelo fato de que somente com este minério não se faz a Bomba Atômica! E, o mais importante, por que não pressionar os Estados Unidos da América e seu par, Israel, e outros países da Europa visando ao desarmamento nuclear? Para Pinguelli, preocupam-se apenas com o Irã, talvez com vistas ao seu petróleo, que é rico e farto, detendo aquele país imenso a segunda ou terceira maior produção do “ouro negro” no mundo.
E mais: com olhos tão grandes deitados sobre o petróleo do Irã, e agora, mais do que nunca, os Estados Unidos procuram esconder de países aliados sinais de desespero em que parece estarem entrando, pelo isolamento a que se sentem submetidos em razão dessa reviravolta no tabuleiro de xadrez internacional.
Nós, brasileiros, devemos, com toda justiça, nos rejubilar de termos conseguido o que os Estados Unidos da América diziam, matreiramente, ser de todo impossível, porque o Capitão América, a voar mundo em fora pelos quadrinhos da mídia dirigida a uma juventude indefesa, não permitiria que sucedesse, mesmo que se alguém fizesse pé firme em sentido adverso às ambições de um império em fim de carreira, praticamente condenado à incômoda condição de moribundo. Deste modo, não faltaria no arsenal de heróis em quadrinhos quem aparecesse para obstaculizar a grande marcha das emancipações de países que tio Sam, cínica e ironicamente, rotulava de ‘em desenvolvimento’. Em vão, porém, visto que as turbulências financeiras sacodem a Europa, impossibilitados que ficam os Estados Unidos de contar com balsas de salvamento que seriam jogadas por presumidos aliados europeus, entre os quais a Rússia, cujo presidente, Dmitri Medvedev, no encontro com Luiz Inácio Lula da Silva em Moscou sob as vistas cautelosas de Putin, que mercê da experiência de antigo chefe da KGB na velha URSS manteve a boca fechada a sete chaves, por assim dizer, cometeu a chacota ou indelicadeza de apostar na chance de 1 a 3 de a missão do presidente brasileiro ser bem sucedida, antes de sua esticada a Teerã. Mais um cordeirinho dos Bush, pai e filho, esquecido nos braços de Obama? Como deve ter ficado a cara do chefe do governo russo após chegarem em Moscou as notícias do sucesso da missão Lula junto ao gigante asiático em campo neutro, a Turquia? Irã é o 6º maior país do mundo. É bom entender que o fato de Teerã haver anunciado, após o acordo, que o enriquecimento de urânio lá continuaria não deve ser levado a termos absolutos ou que isto seja um passo para os iranianos fabricarem a sua Bomba Atômica. Já se disse que a fabricação de um artefato nuclear requer o emprego de muito mais que urânio, ou seja, também de outros materiais estratégicos.
Recorde-se de quando agentes do imperialismo ocidental, em serviço de espionagem e captação de minérios no Brasil por parte de Norteamérica, punham suas mãos no extenso Vale do Rio Doce, desde o Estado de Minas Gerais até a região nobre da Amazônia, em busca de minérios para suas ‘necessidades nucleares’.
O juiz Osny Duarte Pereira lançava seu livro-bomba, na primeira metade do século XX, ‘A antinomia do Acordo Militar Brasil-EUA’, em que denunciava, vale dizer em cores fortes, a desfaçatez dos norte-americanos de impor ao Brasil um acordo francamente lesivo aos interesses nacionais.
Os americanos fuçavam até as areias monazíticas de Macaé, antes de a Petrobras se instalar na cidade mais clara do país: feita a barba diante de um espelho, viam-se com toda nitidez os poros do rosto, como se o rosto estivesse coberto de orifícios deixados por alguma doença misteriosa de pele. As areias da Praia de Imbetiba a sugarem os pés de banhistas, sendo elas monazíticas, dizia uma camareira do hotel encravado numa pedreira do Oceano Atlântico, que dava a impressão de ir, impetuoso, de encontro com a estrutura do Imbetiba.
Agora que a China acaba de anunciar sua aprovação ao acordo nuclear Brasil-Irã-Turquia, é chegada a hora de devolvermos a moeda do impossível aos americanos do Norte, numa referência à pretensão de Lula em sua missão, afinal vitoriosa, no Sudoeste asiático.
Será que o sangue nordestino do presidente brasileiro, caldeado com o sangue indígena, quem sabe dos tamoios, não terá influído nesta sua viagem a um outro mundo, um mundo asiático!?
Não pensem que sou do PT.

domingo, 16 de maio de 2010

O goleiro de um pé só

O goleiro de um pé só

Aqueles que estudaram em minha época no Ginásio, depois Colégio Euclides da Cunha, do professor Messias de Moraes Teixeira, lá pelos anos 40, com o professor Batista faltando só arrancar os cabelos para enfiar lições de gramática ou de outra matéria em certas cabeças não me deixam mentir. Um deles, Antonio Carlos Gonçalves, o Carlinhos, que chegava, às vezes, a esconder debaixo de sua capa de inverno o taco de sua predileção ao sair do salão de sinuca do bar de seu Janjão, do lado direito de quem viesse da estação de trem, atrás da Praça dos Melros, aqueles melros que um dia, por causa do desmatamento desenfreado nas franjas de Cantagalo, se foram como para a eternidade. Boas luas, boas luas... O giz a cantar na ponta do taco que para Carlinhos tinha algo de mágico, por isso Carlinhos o esfregava de cima a baixo com as mãos e, aí sim, assestava a pontaria com a bola 5 azul, a da sorte, acreditava, e inclinando um pouco o taco para que ela recuasse até ao ponto em que ele pudesse alcançar outra bola, a 3, por exemplo, de cor verde e que parara a um canto estratégico. Uma tacada e desperta a bola 7, preta, seguindo-se outras jogadas até balançar a caçapa do final da partida, desta vez o adversário a segurar seu taco sem que desse uma só tacada.
Ninguém, pois, de tempos idos em Cantagalo, como Gutinho, que era bem alto e que insistia em apelidar-me de Gigante, pela minha estatura de Rui Barbosa, sendo que alguns colegas mangavam de minha testa larga, de Rui, diziam, me deixa mentir.
Chamavam-no de Toneca. Era o goleiro do nosso time de futebol no ginasial. Espadaúdo, devido, naturalmente, à muleta que levava no sovaco esquerdo, seus músculos pulando, por assim falar, ao se jogar sobre a bola, desfazendo-se impetuoso da muleta, que arremessava a uma distância de metros, Toneca à espera da bola num dos lados da rede, ora da direita, ora da esquerda, ainda apoiado na muleta, que ele somente jogava fora da área, com destreza e bom muque, firmando-se em um pé, quando o ataque adversário aproximava-se dele. E... pimba!
Toneca não se intimida. O gramado em frente era-lhe um colchão de espumas. Assim, ei-lo estirado no colchão, as mãos calosas, fortes, grandes sobre a pelota, logo a abraçando e, após apanhar a muleta, ergue um braço, a desferir um murro no ar e abrir um largo e fagueiro sorriso por mais um chute a gol aparado no peito.
Não era um craque? E um craque excepcional, de fôlego inusitado. Sua performance em Cordeiro, cidade que se tornou conhecida em todo o país e até no exterior por sua laureada exposição agropecuária ficando a umas três marchas de Cantagalo, era de deixar de queixo caído qualquer goleiro com os dois pés.
Nos treinos, o desafio a fim de testar suas condições físicas e seus reflexos, se estava preparado para enfrentar o próximo adversário. E Toneca empina-se de um lado a outro da cidadela... que vem bala! Ainda bem que de seu próprio time. Isso, porém, não faria a menor diferença. A bala vem, dir-se-ia zunindo, e Toneca mostra que estava em excelente forma. Despede a muleta para fora da área e agarra o petardo, triunfante.
A próxima partida seria disputada no campo do Cordeiro Futebol Clube contra um colégio local, e era grande a expectativa nas duas cidades, baixando sobre elas um clima de preocupação, principalmente entre os professores, tendo em vista o que quase sempre acontecia quando os times de adultos de Cordeiro e Cantagalo se defrontavam: saíam no braço, felizmente sem maiores conseqüências. Por esta razão, o professor “Batistinha” foi ao gabinete do professor Messias fazer-lhe ver a “imprudência” de permitir que os meninos de Cantagalo jogassem com os de Cordeiro. “Vai correr sangue! Vai correr sangue”! bradava “Batistinha”, as faces trêmulas. Messias aproxima-se: “O professor Batista não está exagerando, não está sendo um tanto pessimista?” “Pessimista? Batistinha rebate. “Lavo as minhas mãos! Lavo as minhas mãos!”
Messias, então, sugere que se fizesse uma consulta democrática entre estudantes e professores de seu colégio. Os estudantes ganharam Professor Batista foi voto vencido.
E se feriu a partida no campo do Cordeiro, terminando em zero a zero e um curativo na testa de um aluno de Cantagalo.
“Poderia ter sido pior”, o professor Batista não dava o braço a torcer. E desce o pano...

sexta-feira, 7 de maio de 2010

O 1º de abril de 1964

Marechal Paulo Torres

O 1º DE ABRIL DE 1964

1º de abril de l964. O Brasil amanhecera sob um golpe de estado, com o presidente João Goulart encurralado pelas forças de um poder emergente costurado por civis, entre eles Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, que era governador de Minas Gerais. Lacerda pretendia com seu apoio aos militares golpistas suceder a João Goulart, o qual, quando a chamada Revolução Redentora mostrava as unhas, já preparava sua viagem ao exílio, por mais que Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul, tentasse convencê-lo a tomar uma outra decisão, mais digna, ou seja, transferir o poder da República, provisoriamente, para o Palácio Piratini, sede do governo gaúcho. Brizola oferecia-lhe amplo apoio militar e civil, tanto do poderoso III Exército como da força policial de seu Estado. Além disso, haveria dois fortes escudos a protegê-lo e que eram o governador Miguel Arraes e Francisco Julião, criador das Ligas Camponesas, em Pernambuco e com ramificações por outros Estados.
Goulart, no entanto, preferiu entregar o governo a ver seu país mergulhar numa guerra civil de conseqüências imprevisíveis, como achava que aconteceria se aceitasse a oferta de Brizola. Todavia centenas e centenas de posseiros armados de foices, ancinhos e outros instrumentos agrários aguardavam à hora, que não chegou, de entrar em ação, formando nas colunas de resistência iniciadas pelas Ligas Camponesas de Julião.
Niterói era capital do antigo Estado do Rio de Janeiro. Naquele primeiro de abril, eu e outros jornalistas além de alguns políticos encontrávamo-nos no Palácio do Ingá, sede do governo fluminense, na sala de espera ao lado do gabinete do então governador Badger da Silveira, onde funcionava um serviço de rádio que àquele dia recebia, passo a passo, as informações de Brasília sobre a marcha dos acontecimentos. O ajudante de ordens de Badger trazia essas informações para a imprensa ali reunida.
Súbito, as informações vindas pelo serviço de rádio do Palácio cessaram. Entreolhamo-nos, a pulga atrás da orelha. Ainda esperamos mais um pouco, na esperança de que viesse alguma nova informação, mas o ajudante de ordens fechara-se em copas no gabinete do governador. E um por um dos presentes na sala foram saindo em silêncio. Se havia X-9 naquele grupo não cheguei a saber. Cuidei de ir direto para o centro da cidade, parando por instantes diante de um grupo de militantes políticos que comentavam com entusiástico otimismo o avanço, como acreditavam, das forças leais a João Goulart. Imediatamente, após dizer que vinha do Palácio do Ingá, fiz-lhes ver que, àquela altura o presidente estava fora do governo e que o melhor que poderiam fazer era procurar refúgio em algum lugar seguro. Não demorou, o grupo se dispersava. Na calçada defronte ao prédio onde funcionara, ostensivamente, o Instituto Cultural Brasil URSS, na Avenida Amaral Peixoto, sua fachada permanecia, com todas as letras do instituto em que estudara o russo juntamente com um padre, dois médicos, outros profissionais liberais e duas moças, filhas de um construtor muito conhecido na região e que ajudava financeiramente o “Partidão”. Pela mesma calçada vinha nesse dia o temível Joaquim Metralha, presidente da Liga Anticomunista do Estado do Rio, portando duas sub-metralhadoras Ina, uma em cada lado, um bloco de papel e uma caneta para anotação dos nomes e endereços daqueles que lhe parecessem, ou a seus informantes, subversivos. Havia sempre alguém aproximando-se dele a fim de colaborar com Metralha na relação das residências que haveriam de ser visitadas ou arrombadas.
Foi uma noite de terror aquela de lº para 2 de abril de 1964. Algumas residências, os terroristas de direita encontraram fechadas, e as arrombaram, como, por sinal, fizeram em meu apartamento, dir-se-ia a patas de cavalos. Ficaram p. da vida por se depararem com as estantes das bibliotecas completamente vazias, e cuspiram no vazio... É que muitos dos visitados pela gestapo de esquina haviam se prevenido, ensacando livros e revistas e os levando para as malas de seus carros para descarregá-los bem longe, onde só se ouviam grilos, espalhando-os pelas margens de estradas praticamente cobertas de matagais. O Dr. Augusto Cunha, meu tio, não teve a porta de seu apartamento em Icaraí arrombada, pois a deixara aberta a fim de facilitar a entrada dos policiais e evitar ter que providenciar uma nova fechadura. Neste caso, nem voltaram os olhos para sua biblioteca.
Levaram-no, contudo, para a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio, na Avenida Amaral Peixoto. Não tardou que Elza, sua mulher, chegasse de táxi com um colchonete e roupa de cama. “Zelosa, hein?...”, dizia um X-9 a um policial. E o Dr. Cunha foi deixado numa sala da Secretaria de Segurança. Da janela da sala se via embaixo, no térreo, com toda nitidez – contaria o Dr.Cunha, terminado o pesadelo – um dos lavradores do interior fluminense acusados de ligações com as Ligas Camponesas de Arraes e Julião apanhando com as mãos água da descarga de um vaso sanitário, para beber.
Amanhece. Batem na porta da sala dizendo que acabara a mordomia. E o Dr. Cunha foi encaminhado ao Estádio Caio Martins, transformado em prisão política. Lá encontra vários médicos, seus colegas, engenheiros e outros profissionais liberais seus conhecidos. O meu pai, Aristides Gonçalves, se incumbira de levar diariamente um almoço para tio Augusto no Caio Martins, preparado por minha mãe, Chiquita. Ela e o Dr. Cunha foram criados juntos, na Fazenda do Sobrado, no distrito cantagalense de Boa Sorte.
Quanto a mim, a pular o muro de uma embaixada, preferi sair de óculos escuros, pegar um táxi em companhia de minha primeira mulher Deró, já falecida.
O táxi nos levou até pouco além do bairro Maria Paula, que àquela época tinha mato por todos os lados. Estacionamos rente a uma cerca aparentemente intransponível. Descemos e fomos a pé mais em frente, até chegarmos ao ponto em que sabíamos estar a cerca de acesso ao sítio escondido, de comadre Lourdes, nossa lavadeira de muitos anos.
O sítio, todo arborizado e plantado, tinha início junto a uma imensa pedreira, que dava a impressão de pendurar-se nas nuvens. “Ninguém mais põe os pés aqui, só Deus, porque é o fim do mundo..., dizia-me Agapito, marido de comadre Lourdes. E lá permaneci até o momento em que era informado de que já poderia voltar, sem susto.
Passam-se algumas luas e têm início as nomeações para os governos dos Estados. É nomeado governador do antigo Estado do Rio o marechal Paulo Torres, de centro e cuja honradez era amplamente reconhecida, em especial entre as esquerdas, que puderam, assim, respirar. Com efeito, Paulo Torres, seguido por seu irmão, o jornalista e político Alberto Francisco Torres, logo que assumiu o governo fluminense mandou libertar todos os presos políticos recolhidos ao Caio Martins. Para o marechal, pelo menos no Estado do Rio a ditadura havia expirado, prosseguindo a caça às bruxas em outras partes do território nacional, infelizmente, fora da alçada de Paulo Torres. Este, inclusive, após assumir a presidência do Senado federal pautou seus atos na defesa da democracia, com discursos inflamados em favor de justiça social, a ponto de preocupar, às vezes, seu irmão Alberto Torres, como diretor do diário O Fluminense. Nessa ocasião eu editava a página de política do jornal, quando o Dr. Alberto, assim o chamávamos desce do seu gabinete até à Redação, senta-se a meu lado e estica para mim um longo telex. Olho: era um discurso do marechal-presidente do Senado e que bem podia ter sido pronunciado por alguém de esquerda, não digo extremada, porém numa linha francamente legalista. Coçando a cabeça, Dr. Alberto quis saber minha opinião como editor da página onde deveria sair aquele pronunciamento. “Não vejo nada demais em publicá-lo”, opinei. “Você acha?”, Dr. Alberto ainda incrédulo. “Acho que devemos publicar”, reforcei. “Afinal, é meu irmão... Se não publicar, vou-me ver com ele...” E decidiu: “Se você acha...Publique-se!”
Dr. Cunha, não mais perseguido, passara a admirar o marechal Paulo Torres, em quem votaria sempre que houvesse eleição e ele fosse candidato”.
Conversa de rua:
─E que teria sido feito de Joaquim Metralha?
─Apareceu morto em seu sítio para os lados de Cachoeiras de Macacu, dizem. Morto por ladrões.
- Huum... Sei lá...!