segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

O fio da droga I

O fio da droga (1)
-- I --

Quem pervagar as sombras da II Guerra Mundial estará, certamente, informado da Operação Husky (Brutamontes) ou Lucky: assim identificada por ter tido como patrono Salvatore Lucky Luciano, que pelo menos até começos de 1943, nos Estados Unidos, cumpria pena equivalente a prisão perpétua, logo reduzida para 9 anos e 6 meses, resultante de 32 condenações. O abrandamento destas pela Justiça americana se deveu a que Lucky Luciano, que mesmo encarcerado não perdera a condição de rei da Máfia nova-iorquino-siciliana, participou decisivamente, embora de longe, já em confortáveis aposentos da penitenciária de Great Meadows, da campanha na Sicília, Itália.
Em outras palavras, aceitando um acordo proposto pelos serviços secretos da U.S. Navy através de Moisés Polakoff, famoso advogado de mafiosos, então contratado por clientes legais para estabelecer os primeiros contatos, Lucky Luciano acabou por emitir mensagens aos “notáveis” de Villalba, aldeia a 60 km de Palermo. Na forma de um lenço amarelo, de seda, com a inicial L, empacotado, que caiu atado a um minipáraquedas próximo à residência de Calogero Vizzini, o dom Calo, um dos chefões da Máfia villalbesa. E o lenço amarelo funcionou como luz verde para o desembarque de tropas aliadas na Sicília Central e Ocidental, em meados de julho de 1943.
A estratégia fora traçada durante reunião da Força 141, em Argel, no quarto nº 141 do luxuoso e tropicalesco Hotel Saint-Georges, sob a direção do major-general inglês C.H. Gairdner, tendo a operação sido decidida em Casablanca de 19 a 23 de janeiro, escolhido o general Eisenhower para comandá-la; ele se encontrava, na época, em campanha na Tunísia.
A Máfia siciliana abriu de muito bom grado os caminhos da Itália para as forças aliadas, enquanto a União Soviética, contando apenas com suas próprias forças, enfrentava estoicamente a marcha nazista.
A “Honrosa Sociedade” engajara-se na guerra. Em troca de liberdade para Lucky Luciano e de vista grossa da Justiça americana ao tráfico de drogas, dentro de seus limites, e atiividades paralelas. Com efeito, em 9 de fevereiro de 1946 os EUA devolviam a Lucky sua cidadania, e ele foi recebido na Itália com fogos, banda de música e calorosos discursos de boas-vindas. Pôde dedicar-se ao ramo até janeiro de 1962, quando morreu, como um “anjo”, em Nápoles, cercado de irmãos da Cosa Nostra.
Este pode ser o fio da meada do narcotráfico nas Américas, a levar política e vingativamente à prisão o general Manuel Antonio Noriega, sob as mesmas acusações imputadas ao general Omar Torrijos Herrera (1929-81), vitimado em acidente aéreo presumivelmente provocado pela CIA, inscrito na História centro-americana como um de seus heróis. Com a diferença de que Noriega foi contratado por George Bush quando o atual presidente dos EUA(2) era diretor da CIA, para missões ultra-secretas na América Central, inclusive de envolvimento tático com o narcotráfico. A isto se poderia chamar de Plano Medellín, uma Operação Lucky às avessas. Ou estilizada.
O teatro de guerra, agora, é a América Central, especialmente ou por enquanto a Colômbia e seu prolongamento natural, o Panamá. Noriega teria traído o código da
“Honrosa Sociedade” do Pentágono a partir do momento em que deu sua guinada nacionalista, seguindo o exemplo de Torrijos: o Panamá para os panamenhos. E eis, também, a razão por que os EUA são os maiores fabricantes de cocaína no mundo.



(1) Ultima Hora, pág.4, UH opinião, 11 de janeiro de 1990
(2) George Bush, pai, governa os EUA de 1989 a 1993, sucedendo-o Bill Clinton, mantido no poder até 2001, em dois mandatos.

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